29 outubro 2010

Sonhos nunca morrem


É meu dever vir a público hoje, quando todos os brasileiros mandaram seu texto-despedida na campanha eleitoral, para deixar algumas palavras sobre o pleito. Antes, porém, preciso dizer que estou esgotado. Se não fisicamente - e ainda que o batente esteja pesado o suficiente para me afastar do blogue -, ao menos mentalmente a bateria está quase arriando. Minha Evinha, aliás, deve ser quem mais anda sofrendo com algumas mudanças graves no meu comportamento nos últimos dias. A ela peço desculpas, mas é que eu não consigo evitar pensar no jogo político de maneira saudável, fato que se agrava em ano de eleição.

Destaco ainda que não tenho a pretensão de convencer ninguém a essa altura do campeonato, até porque a maioria da minoria que aqui passa já definiu o voto. Quero, de fato, explicar o motivo de minha opção por Dilma Rousseff, reafirmando algumas verdades que conduzem minha lida, que raramente me beneficiam diretamente e que foram herdadas nem sei de quem. Nasci numa família reacionária até o último editorial do Paulo Francis e me lembro de tomar uns safanões dos meus pais em 1989, quando avistávamos algum comício petista e eu saía gritando "olê-olê-olá-Lula-Lula". Ademais, nunca me faltou nada, sobrou até, e felizmente moro num lugar que, até uns dez anos atrás, era vizinho de gente muito pobre.

Foi esse choque de realidade, aliado às lições que tive dos meus padrinhos, que provável e imperceptivelmente minha indignação constante com injustiças e desigualdades foi fomentada, algo que mais tarde vim teorizar e aprofundar por meio da minha parca instrução marxista. De modo que, repito, não venho aqui cagar regras, como habitualmente se faz numa campanha. Convido a todos para compartilharmos sonhos em comum, cuja pedra fundamental foi plantada no ano de 2002.

Para ilustrar melhor, volto à noite do dia 27 de outubro daquele ano. Levávamos, pela primeira vez, um dos nossos à presidência da República. Em mim, marcou uma cena deveras impactante: um senhor de 50 e poucos anos, sentado na calçada de uma Avenida Paulista tomada por milhões de pessoas, chorava. Quando ele olhava para sua bandeira surrada do Partido dos Trabalhadores, chorava mais ainda. Quando a visão focava a enorme foto de um sujeito barbudo esticada em frente ao prédio da Gazeta, o troço ficava indecente. E emocionante. Por não ter testemunhado a repressão e por não ter sofrido as decepções nas Diretas Já, 89, 94 e 98 mais profundamente, entendi o significado daquele pranto só alguns anos depois. De toda maneira, aquelas lágrimas de desabafo me deram a imediata certeza de que Luiz Inácio Lula da Silva não só faria um bom governo, como também iria mudar os rumos desse país.

Desde então, passei a viver mais intensamente o processo político. Quantos não foram meus princípios de úlcera a cada tentativa de golpe que essa imprensa suja tentou contra nosso presidente? Não aceitavam, e ainda não aceitam, a valorização do povo pelo Estado. Particularmente, fui vítima de uma pequena campanha de difamação da Falha de S.Paulo. Criei, logo depois de entrar no Orkut, a comunidade Viva Lula, cuja descrição diz:

"Como só existem comunidades que nasceram para falar mal do governo Lula, esta aqui se propõe a mostrar o quanto o país melhorou desde a saída do nosso tirano e entreguista FHC.

Desde já, o iniciador desta comunidade acredita que existe uma verdadeira conspiração por parte da imprensa - em especial a Folha de S.Paulo - contra o presidente, assim como já ocorre com Fidel e com Chávez."


No dia 1º de agosto de 2004, a versão online do referido jornal publicou uma matéria sobre sátiras preconceituosas contra Lula na rede social e, num tremendo pluralismo sacana, elegeu a Viva Lula como exemplo de contraponto. Deixaram no ar a suposição de uma postura intolerante com a imprensa
(que eu ainda não tinha), ao afirmar que me contataram e eu não retornei, fato que nunca ocorreu. Busquei reparação via ombudsman e, não obtendo resposta, fui um dos pioneiros na arte de cancelar a assinatura daquela merda por motivos políticos.

Tudo isso, enfim, para chegar neste 2010 tão carregado de significados, como 2002 foi para aquele senhor que chorava copiosamente após a primeira vitória do povo. Acredito que todo desaforo que venho mantendo sob controle desde o episódio com a Falha esteja entrando em ebulição agora. Naquela oportunidade, muitos me disseram: "ah, tua assinatura não fará cócegas nos cofres da Barão de Limeira, 425". Deixei guardado cá no peito o sonho de, um dia, ver toda esse castelo de areia desmoronar, como está de fato acontecendo. A eleição de Dilma no domingo irá fazer não só esse grito sair da garganta, mas também vai renovar a carga de utopias. Oras, não é para isso que estamos aqui?

Dilma neles!

P.S.: se você acha que seu combustível está na reserva e não agüenta até domingo, passe nos blogues do
Simas e do Edu Goldenberg. Funcionou comigo.


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